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18
Mai 10

As diferentes fases do linho

 

Em Portugal o cultivo do linho pouco difere de região para região (Alves, 2002). As mudanças mais significativas dão-se ao nível do vocabulário que identifica certas operações de processamento e os utensílios ou equipamentos próprios deste labor.

A variedade usada é geralmente o linho “galego” que deve ir para a terra na primeira quinzena de Abril sendo arrancado em Julho, após um desenvolvimento médio de cem dias.

Sementeira – Com o terreno pronto, bem adubado, lavrado, gradado e dividido em leiras, faz-se o lançamento das sementes para a terra. A sementeira é feita em lance farto (mão cheia) verificando-se ainda um antigo costume de molhar com saliva a cabeça do dedo polegar e encostá-lo à terra: se vierem sete sementes agarradas, o campo considera-se bem semeado.

Regas – A primeira rega, ligeira, deve ser efectuada três dias após a sementeira se o tempo estiver seco e quente. As restantes até um máximo de doze, embora haja quem defenda o máximo de nove (Costa, 2009), devem ser consoante as necessidades da terra.

Mondas – o arranque das ervas daninhas deve acontecer um mês após a sementeira e está bem patente na seguinte quadra:

 

Eu hei-de ir ao teu linhar

Que o teu linhar tudo tem

Tem gorga, tem Saramago

E pesseguelo também

 

 

 

Arrancada – No início de Julho, a planta perde a flor de cor azul-violeta e começa a ganhar uma cor amarelada.

Nas pontas nasce a “baganha”, uma espécie de casulo que vem substituir a flor, dentro da qual estão as sementes do linho, designadas por linhaça. Se o linho estiver forte, bem desenvolvido, cada baganha deve conter dez a doze sementes de linhaça.

 

Donde vens ó Ana?

Venho da montanha

De regar o linho

Que já tem baganha

 

Chegou a altura de fazer a colheita, que em algumas zonas pode ser conhecida por “arrinca” ou “arreiga”, devido ao facto da planta ser arrancada com a raiz.

Ripagem – O linho é então junto com a raiz para o mesmo lado, sendo-lhe retirada a baganha com a ajuda do ripo.

Consoante as zonas, esta espécie de pente grande com dentes de ferro, toma as designações de ripador, rapigo, ripanço. A operação também se designa por desbaganhar, ripar, ou arripinhar. A baganha depois de esmagada e apartadas as sementes, servia, antigamente, para encher travesseiros, almofadas e colchões.

Da semente obtida, reservava-se uma parte para a próxima sementeira e a restante para aplicação medicinal (papas de linhaça), infusões e ainda para a indústria de tintas e vernizes.

Maceração – Depois da ripagem o linho é separado em molhos e afogados ou enriados em água. Podia ser no rio, num tanque, numa presa ou numa poça, que tinham a designação específica de poças do linho. Na Freguesia de Âncora ainda hoje existe uma pequena lagoa conhecida entre os locais pelo topónimo de “Poço do linho”.

O objectivo desta maceração é a dissolução dos cimentos pécticos e hemicelulósicos que ligam os feixes de fibras entre si e durava em média 8 a 10 dias, consoante a temperatura da água (Oliveira, 1978).

Secagem – Depois de saírem da água os molhos de palha são abertos e postos a corar de oito a doze dias, havendo o cuidado de os manusear com cuidado para não partir e que a secagem fosse rápida e uniforme. Se forem dadas muitas voltas e de forma descuidada obtinham-se fibras curtas e grande quantidade de estopas o que era de evitar. A palha está macerada se apresentar um tom cinzento prateado e se separe facilmente da fibra por fricção dos caules na mão.

Maçar – Esta operação, quando manual, é efectuada sobre um bom cepo de madeira ou uma pedra lisa. Esmaga-se a palha batendo com um maço de madeira até a parte lenhosa se separar da fibra.

No entanto, esta operação podia ser efectuada com recurso a um “engenho”, primeiro mecânico e depois com recurso à energia hidráulica. Este equipamento era geralmente colectivo, mas há casos de famílias mais abastadas que tinham o seu próprio engenho.

Em volta da Serra D’Arga, com a pulverização dos terrenos e o carácter essencialmente de auto consumo do linho eram raros os engenhos e regra geral as maçadas eram manuais.

Amadar – Esfrega-se manualmente o linho maçado, torcendo-o em espiral para separar os restos de celulose e para o tornar mais maleável.

Espadelagem – Consiste em bater pequenas porções de linho na boca de um cortiço cilíndrico ou num espadeladouro com a ajuda do espadelo, uma espécie de cutelo em madeira.

A espadelagem é uma fase que requer muita habilidade e efectua-se geralmente em volta da eira ou ao serão, juntando-se a família, os vizinhos e os amigos. Iremos debruçar-nos mais à frente sobre esta manifestação sociológica de enorme significado. Por acção da espadelagem vão soltando-se os tomentos, que são as fibras mais ásperas do linho.

 


Sedar – O sedeiro é um equipamento muito simples que funciona como um crivo e apresenta dois tipos de malha, uma mais grossa que outra. A mais grossa destina-se a separar a estopa grossa dos fios mais finos; a malha mais fina separa a estopa linheira das fibras do linho.

Fiação – Trabalho muitas vezes feito ao serão, junto à lareira, com o auxílio da roca e do fuso. Por torção das fibras têxteis vai-se construindo um fio que deve ser uniforme em todo o seu comprimento e ter entre 40 e 50 fibras (Caldas, 1991).

Depois de fiado e enrolado em maçarocas, o fio, com a ajuda do sarilho é dobado em meadas. Na Serra D’ Arga o sarilho tem a particularidade de ser feito em madeira e canas; noutros lugares é exclusivamente usada a madeira.

Cozedura – As meadas são então metidas em potes de ferro e fervidas durante sete horas para tornar o fio mais macio. Nesta fase podem-se acrescentar algumas substâncias para tingir o linho, como por exemplo, cascas de nozes para o fio ficar com tom castanho (Domingues, 2009).

Barrelas – Depois de cozidas, as meadas são introduzidas num cortiço ou em panela de ferro em cuja boca se estendeu um pano coberto de cinza, proveniente de lenha de vide, chamado barreleiro. Durante vários dias deita-se periodicamente água a ferver. O líquido passa pelo filtro do pano com cinza acumula-se dentro do cortiço com as meadas de linho e escoa-se lentamente pelo fundo, havendo o cuidado de manter a barrela sempre quente e bem tapada.

Na Serra d’Arga acrescentam-se à cinza, bocados desfeitos de sabão rosa, farinha milha e algumas ervas (mentrastos, funcho ou aradeiras) para amaciar o linho. Havia quem acrescentasse à barrela um pouco de bosta de vaca. Após a barrela, as meadas são batidas e lavadas nas pedras do rio ou tanque, preferencialmente em água corrente, para depois serem estendidas a secar (Domingues, 2009).

 


Dobadoura – Consiste em passar as meadas bem secas para novelos de fio.

Urdidura – É a preparação dos fios de teia para serem, de seguida, colocados no tear, operação deveras complexa devido ao grande número de linhas que tem de ser colocadas em paralelo e que vão determinar a largura da peça a tecer.

Tecer - Chega então o momento de começar a tecer o pano fazendo passar a lançadeira entre a teia, com o tear a mover-se comandado pelos pés da tecedeira num movimento sincronizado, mil vezes repetido fazendo crescendo o labor, linha a linha, escassos palmos por dia, até à obra acabada.

 

publicado por Brito Ribeiro às 10:27
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Boa tarde.
Excelente trabalho de divulgação de todo o tratamento do linho.
Será possivel dizerem-me onde posso arranjar um molho de linho em "bruto" ?
É Para um Museu de Artes e Oficios em Grijó.
Obgdo
Fernando Batista
Fernando Batista a 7 de Setembro de 2010 às 15:01

Obrigado pela visita e comentário. Nesta zona já não há quem cultive regularmente a planta do linho. Aconselho-o a contactar o pelouro da cultura das Câmaras de Ponte de Lima ou de Vila Verde, Concelhos onde esta cultura ainda se realiza e onde eventualmente pode obter a informação que necessita.
Cumprimentos
BR
Brito Ribeiro a 7 de Setembro de 2010 às 16:32

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